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Luz + design


Com uma trajetória singular, Carlos Fortes transforma e ilumina projetos com a sua luz.

Uniflex: Falando em feiras internacionais e nacionais, o que você pode nos dizer sobre a evolução tecnológica dos produtos luminotécnicos nos últimos dez anos?

Carlos Fortes: Essa foi a segunda ou terceira explosão no mercado. Antes do ‘boom’ do LED no final dos anos 1990 e 2000 teve o início da disponibilidade de lâmpadas mais eficientes, aquelas lâmpadas que permitiam que pudéssemos projetar não pensando em 40 watts por metro quadrado e, sim, 17, 18 e 20 watts por metro quadrado. Quando iniciou a indústria do LED, ela começou lenta. Não foi uma coisa que chegou rápido. Nós víamos o produto como coisas experimentais. O que acontece é o seguinte, essa experimentação, essa fase em que começamos a usar LED, foi mais como uma possibilidade, ainda com uma série de restrições de qualidade cromática, de fluxo, pois alguns emitiam muita pouca luz e não tinham boa reprodução de cores. O LED evoluiu numa curva parecida como a da Internet. E após cinco anos, talvez, tenha sido uma revolução completa no mercado. Hoje, não existe mais lâmpada, não se fabrica mais lâmpada. Tudo o que se aprendeu ou que se fazia ou existia na época da indústria até os anos 2000 e poucos não existe mais. O LED colocou a indústria da iluminação de cabeça para baixo, uma mudança radical! O que acontece com o LED são as possibilidades de produtos, de criação e de fazer efeito que se abriram muito. Se com a abertura de importação já havia aberto o mercado de iluminação um pouquinho, com o LED implantado essa abertura foi total porque com ele você pode fazer qualquer coisa. Não existe mais limite em iluminação. Você pode ter pouca luz como pode iluminar um estádio de futebol para a Copa do Mundo. Pela primeira vez, um único tipo de fonte de luz, claro que com as variações de produtos, lhe permite fazer qualquer coisa dentro da iluminação. Aí esse interesse, essa coisa de que todo mundo faz projeto de iluminação, todos os projetos de arquitetura demandam a presença de um lighting designer, todas as concorrências públicas exigem um lighting designer porque entram as certificações ecológicas devido o LED produzir um consumo muito mais baixo, com menos poluentes, vidas muito mais longas. Então, surgiram em parâmetros de projeto outros padrões de conservação de energia e de consciência ambiental que antes não havia. E a matéria de novo tornou-se algo muito ampla. Em resumo, o que mudou radicalmente o mercado de iluminação foi o LED. Nunca fiz um curso próprio de iluminação, mas tive grandes professores que me ensinaram na prática, aprendo com todas as viagens que faço para conferências, feiras, escrevo para revistas especializadas e aprendo todos os dias com todas essas referências. Eu faço um projeto hoje, e digamos que eu tenha feito um projeto grande, como o do Sesc, hospitais, que são projetos que não se fazem em 12 meses, mas são executados em 30 meses. Então, daqui a três anos, o que eu fiz hoje será executado e, muito provavelmente, terei de olhar tudo o que estava especificado naquele projeto porque a probabilidade dele estar desatualizado é muito grande. O desenho da arquitetura não muda nada. A visão que se tem da arquitetura em relação ao desenho e o meu traço de desenhar a luz é a mesma. O meu olhar de arquitetura é o mesmo.

 Uniflex: E como se faz quando se pega uma casa modernista como a do Warchavchik, do professor Katinsky, dos arquitetos modernistas, onde a iluminação foi feita com aquele olhar e naquele tempo, e você precisa fazer toda a iluminação de uma dessas ‘casas ícones’. Você trocaria tudo? Carlos Fortes: Uma pergunta difícil de responder. Isso está acontecendo comigo. Uma arquiteta me pediu para atualizar a iluminação de uma casa que tem 50 anos e foi projetada e construída pelo Sergio Bernardes. Os moradores têm hoje em torno de 90 anos. Não é impossível. Claro que não é impossível! Mas é completamente diferente do que se pensa hoje em termos de iluminação. Primeiro, naquela época não existiam muitas possibilidades. O que existiam eram lâmpadas incandescentes e fluorescentes. Basicamente só isso. As possibilidades de se fazer soluções legais dentro de uma casa eram difíceis porque ou você utilizava uma ou outra. Lâmpadas fluorescentes não se usava em uma sala ou uma área social. Lâmpadas incandescentes exigem encher de buraco o concreto de uma laje. O que acontece? Se você olha muitas casas, não somente dessa época, mas também mais recentes, estamos falando das décadas de 1950, 1960 e 1970, são casas projetadas praticamente com abajures. Você entra em uma casa do Sergio Bernardes, do Paulo Mendes da Rocha, em casas de concreto aparente dos modernistas brasileiros não existem luz no teto. Então, como faço para resolver desafios como esses? As ideias vão surgindo e o LED te permite isso, pois como eles são muito pequenos, vou procurando naquela arquitetura coisas que posso fazer para melhorar a iluminação, para agregar a iluminação naquela arquitetura sem descaracterizar o desenho original. Você até pode colocar spot, trilhos, mas perde toda a característica original da casa. Ao mesmo tempo, nessa casa construída para esse casal as necessidades são completamente diferentes daquela época pelo próprio envelhecimento de ambos. Por isso, a casa precisa de uma iluminação melhorada porque tornou-se um local até perigoso para quem mora ali.

Uniflex: Quais as diferenças entre fazer um projeto luminotécnico de uma residência e de um espaço comercial?

Carlos Fortes: A diferença fundamental e óbvia é que a casa é um lugar onde as pessoas irão viver. Então, o primeiro ponto é o que as pessoas que viverão naquela casa gostam, querem, pretendem e entendem por uma boa iluminação. Eles não precisam saber nada de iluminação e não é falar: eu quero uma luz indireta, eu quero um abajur. Não é isso. É você entender o que a pessoa gosta, por exemplo, de ler, de penumbra, se ela faz muitas festas ou se esta casa é para receber os seus netos e eles a querem muito clara. Ou não gosta de ler porque tem labirintite. Enfim, mil coisas que você precisa entender e a principal é quem viverá ali. E desses entendimentos, às vezes, tem coisas que repercutem na iluminação e que você nem sabe. Não é todo mundo que tem a consciência de dizer que a labirintite pode ser piorada ou amenizada com determinada luz. Uma casa para um casal de 20 anos é diferente de uma casa para um de 70 ou 80 anos. A necessidade de se ter mais luz para determinadas tarefas é maior com a idade. O segundo ponto é que algumas pessoas não gostam de muita luz, pois tem fotofobia e precisam de luz com pouco ofuscamento. Outras já tem uma mania, hábito ou uma experiência ruim que a leva a ver de maneira errada e querem a casa muito iluminada. Normalmente, as que falam que querem uma casa muito iluminada é porque vivem em um espaço escuro. Ou seja, um local que não tem a iluminação boa para a leitura de um livro, o banheiro não é bem iluminado para a maquiagem etc. São todos esses fatores de hábitos que precisamos entender para fazer e colocar no projeto. Então, a personalização do projeto de uma casa é feito em função da demanda de quem viverá ali. Uma casa na cidade onde você mora é diferente de uma casa em que você vai somente nos fins de semana. Estes são os aspectos que direcionam um pouco para o tipo do meu trabalho de iluminação. Em um projeto comercial ou corporativo, o primeiro ponto, tanto em um como no outro, é o aspecto técnico. Em uma loja, por exemplo: qual é o primeiro ponto que você precisa reconhecer e pensar em uma loja? Aquela loja precisa vender o produto antes de tudo. Ela pode ser uma loja popular, barata, de alto luxo, uma joalheria, uma loja de tecidos ou uma loja de carros. Antes de mais nada, é preciso identificar a categorização do produto e o tipo de produto. A partir daí propor soluções mais adequadas para aquele produto. Quando você vê uma loja de rua, de centro, muito iluminada sem muito contraste, a impressão que dá é que ela é uma loja de produtos baratos. Se você pensa em uma boutique, uma loja de roupas, de sapato, de acessórios que tem uma iluminação mais dramática, mais calma, mais pontual, já a impressão é de um estabelecimento de alto luxo. Ela não tem uma ‘iluminação de farmácia’, por exemplo. Não quero dizer que uma loja está mais certa do que a outra. As duas estão corretas porque o objetivo delas é vender e o comércio é isso. A questão é você identificar o cliente, o seu público-alvo. Uma vez, fui no restaurante do Rogério Fasano que ainda não estava pronto. Faltava entrar automação e ainda estava com a luz desregulada. Foi quando ele disse: “Nossa, o que é isso aqui, está parecendo uma pizzaria?”. Não falou nada da luz, mas ela ainda não havia sido regulada, focada, dimerizada… Então é isso, a identidade.

Uniflex: Quando entra a iluminação em um projeto arquitetônico?

Carlos Fortes: Olha, o ideal é o projeto de iluminação entrar quando o projeto da arquitetura já está definido, já tem um estudo preliminar e já tenha um projeto conceitual encaminhado. A partir daí é que os projetos complementares começam a trabalhar em cima daquela arquitetura. Primeiro, a arquitetura precisa nascer definindo espaços, fluxos etc. Uma vez definida, o ideal é que logo nessa fase entrem os estudos complementares para fazerem os seus estudos preliminares, que são: iluminação, paisagismo, instalações elétricas… Depois, vem o projeto executivo, aquele que fornece para a obra o que será executado com base no projeto. O projeto da cortina ou persiana deve ser pensado antes da automação, para que já as cortinas também possam integrar o circuito, criando assim um ambiente mais conectado, trazendo ainda mais conforto e comodidade. É preciso que seja especificada a quantidade de motores e escolher os tipos de produtos que serão instalados para poder criar e programar os cenários de cada ambiente, deixando a casa mais integrada. Também é importante especificar o tipo de cortina ou persiana que será instalado ainda no projeto porque é necessário saber o tamanho da sanca e se ela precisará de reforço. Por exemplo, se elas forem instaladas em um pé-direito duplo, as peças ultrapassam muitas vezes a medida de 5 metros de altura, com larguras que podem passar de 3 a 5 metros também. Com essas dimensões o produto fica pesado. Por isso, o projeto para a sua instalação precisa ser forte o suficiente para suportá-la e uma boa arquitetura não traz rolôs aparentes. Mas se não houver a automação, o produto também pode ser motorizado e acionado a partir de controle remoto. Nestes casos, é interessante que o ponto elétrico já esteja pronto. É imprescindível você ter o tamanho da cortina e o da sanca exatos, além do ponto elétrico na hora em que ela for instalada. Se tudo isso não tiver sido programado, haverá problemas na instalação da peça. Isso ainda acontece muito. A Uniflex, por exemplo, lançou em 2020 o motor wirefree – que não precisa de fios elétricos. É um motor com uma bateria recarregável, que com apenas uma recarga dá uma autonomia em torno de sete a oito meses entre as recargas, dependendo da quantidade de acionamentos no período. A recarga é feita a partir de um carregador de celular super simples e prático, sem infraestrutura elétrica, obra ou pintura.

Uniflex: Como é projetar para um museu ou galeria de arte?

Carlos Fortes: São duas coisas. Uma é a arquitetura: se é uma galeria de arte contemporânea, ou uma galeria para eventos não físicos. Outra são as recomendações técnicas, os padrões que você tem de ter aplicadas ao museu, como o controle de radiação ultravioleta, a intensidade de luz, dimerização, sistemas flexíveis que permitam iluminar uma parede longineamente ou obras pequenas inseridas em uma parede. Em um museu ou em uma galeria de arte são esses parâmetros. Você projeta um sistema que seja flexível o suficiente para as ocupações diversas que existirão ali dentro. Se é um museu fixo como o da Estação da Luz e do Museu da Língua Portuguesa, que fizemos há alguns anos, eles possuem uma museografia fechada. Não são museus de exposições variadas. Até existe uma sala para exposições variáveis. Nesses tipos de museus ou outros que eu não tenha feito, como o Museu do Futebol, o Museu da Imigração, possuem exposições fixas. Então o projeto é feito para aquela exposição, para aquela ocupação.

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